Desde que fecharam a Vivenda Silva (os degraus transformaram-se numa cinzenta parede de tijolos com uma inútil porta a meio) passámos a visitar apenas o J. Encontrou rapidamente outro poiso ali perto e parece mais feliz longe da confusão que já se gerava naquele sítio. Acordamo-lo sempre e tem-nos sorrido – o inexplicável sorriso de tão sincero e natural. Já percebemos que a nossa companhia, um cigarro partilhado, um bom chá com bolo-rei, são a receita para nos aproximarmos dele e a para nossa amizade aumentar. Os frutos serão colhidos quando a época chegar – e por melhor que conheçamos o tempo, não sabemos quando chega.
O Sr. V também já estava enroscado nos cobertores. Ficou deitado a conversar connosco, desta vez sem dar aqueles murros no peito mostrando a sua valentia. Estava mais melancólico. Relatou mais um pouco do seu percurso e como espera ansiosamente a terceira (e talvez derradeira) oportunidade para ir com o primo para a Holanda. O seu modo sofrido de contar tudo e lembrar o passado gela mais que o frio da noite. Pode ser que não o encontremos no próximo Domingo – e como isso será mau e bom ao mesmo tempo.
Mais à frente conhecemos novos amigos, bastante animados no frenético conhecimento de quem éramos e quem se mostravam ser. Em grupo espantam o frio, a fome e a solidão – e livram-se, no fundo, cada um de si próprio, no que de mau fazem a si mesmos. Prometeram encontro dali a uma semana. Foi um encontro rápido, como a noite que se esgotava.
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