A ronda começou ainda em Nossa Senhora de Fátima, com a visita do Sr. A. Pelo que me contou, não é a primeira vez que ali passa aquela hora, para pedir uns bolinhos antes que eles sejam enfiados nos saquinhos brancos e nas malas dos carros. Foi-lhe amputada uma perna há cerca de cinco meses, devido a uma infecção, mas diz que a vontade de viver é tanta, que ele sabe que vai voltar a andar. E diz isto a sorrir, sentadinho numa cadeira de rodas, quase esquecendo que não é ele a empurrá-la sozinho.
De mala bem recheadinha, seguimos para casa da D. A. Custa um bocadinho não levar o Sr. J. connosco. Como ficou doente, o filho veio buscá-lo ao Porto e levou-o para V. Sentimos saudades e vontade de estar com ele. Faz mesmo falta o jeitinho dele doce, sereno e agradecido.
Chegados a casa da D. A., o nosso passo feliz e quase desprendido cruzou o passo silencioso e desconfiado dos bichinhos de estimação do pai da D. A. Sim, os dois cães simpáticos e nada ameaçadores não estavam afinal do lado oposto do muro, à espera do momento certo para representar o seu numero preferido (saltar e saltar e saltar e saltar e ladrar e ladrar…), como de resto já nos têm vindo a habituar. Estavam sim, do mesmo lado que nós, ou seja cá fora!...Achamos por bem comunicar com a D. A. via telefone, antes mesmo de arriscar as calças do Nuno, os calções da Andreia, as pernas do Pedro ou o vestido da Joaninha. A D. A. não estava lá, disse-nos que já tinha ido para a casa da Senhora de quem toma conta. Deixámos o saco e partimos para a rotunda. Depois de passarmos no cantinho da I., e termos verificado que ela não estava lá, fomos ter com o Sr. M. O Sr. M. estava muito calmo, sorridente, que saudades eu já tinha de o ver assim. Precisa de cortar a barba e o cabelo e disse-me que gostava mais do Inverno do que do Verão. O problema é o Sr. M., o senhor que está a dormir lá ao lado. Fica o tempo todo a dizer mal do Sr. M., a dizer que ele não toma banho, que cheira mal, que assim não pode ser. Enfim, é uma pessoa notoriamente revoltada com tudo e com todos. Vamos ver como será. Depois de algum tempo na rotunda, partimos para o prédio. Já lá estavam o B. e a R. à nossa espera. A R. contou-nos que a mãe do B. foi às compras e trouxe roupinha para os dois. Ela trata a R. como se também fosse filha dela, é incrível! Também nos disseram que foram ao centro de emprego inscrever-se num curso de formação e estavam à espera de ser chamados. Parece-nos que o B. continua sem muita vontade de trabalhar, enfim. Esta dependência que ele ganhou às carrinhas que distribuem comida e roupa, também não parece estar a ajudar muito. A R. vai saber agora as notas, vamos ver se passou de ano.
Às vezes quando chego a casa, no fim da ronda sinto-me triste. Penso inevitavelmente no tempo que vai passando, por nós e por eles. Penso no tempo que vai passando por mim. E durante esse bocadinho, desisto.
Outras vezes, acontece como hoje, em que chego a casa e só me lembro do olhar do Sr. M., do sorriso do Sr. A. Agradeço a Jesus poder ter tocado na mãozinha do Sr. M., agradeço a fragilidade dele de hoje, que ás vezes parece não existir, e que hoje, só hoje, nos torna tão próximos. E é nessa fragilidade e nesse olhar, que eu insisto.
Desisto e insisto. Obrigada.
*Joaninha.
1 comentário:
Bem que eu dizia que só tínhamos ficado com espaço para melhorar. As coisas foram muito diferentes nesta ronda.
Beijo, Joana!
Enviar um comentário