quinta-feira, outubro 09, 2008

Crónica da Areosa - 05.10.08

Numa efeméride que colidiu desafortunadamente com um domingo, iniciamos mais uma jornada de sorrisos, como gentilmente gosto de a pensar. Em dia de comemoração da implantação da República, eu, a Ana, o Pedro, a Maria e a Andreia partimos rumo à implantação de alguma cor no dia-a-dia de quem perdeu os seus lápis de cera na longa rua da vida. A nossa tarefa (da qual sei que nos orgulhamos) é fazer com que estas pessoas não percam a vontade de pintar a sua vida, por mais taciturno que o desenho lhes possa parecer.
A noite estava bela, mas sarcasticamente fria. Iniciamos a ronda visitando a ilha, onde esperávamos encontrar a D. A e a S. Não tivémos muita sorte desta vez: tanto uma como outra não estavam em casa. Deixámos um saco junto ao anexo da S, como habitualmente, para que ela sentisse aquando da chegada que os seus amigos de sempre estiveram lá para mais umas boas conversas. Quanto à D. A, para além do saco, resolvemos também deixar-lhe um bilhete que a informava acerca das horas a que costumávamos lá passar todos os domingos, de forma a podermos vê-la e falar-lhe mais regularmente; no final, não nos privamos de lhe desejar uma óptima semana.
Dirigimo-nos de seguida para junto do Sr. J, pessoa que nos dá uma lição semanal da verdadeira essência da vida. Foi desconcertante a situação em que o encontrámos. Dormia sobre um papelão, tremia de frio e envergava um semblante que nem adormecido escondia o sofrimento pela condição. Apressámo-nos a arranjar um cobertor que se pudesse atenuar o seu frio, juntamente com uma sopa quente. Como sempre, o Sr. J agradeceu-nos amavelmente, concedendo-nos a honra de achar que podemos estar a criar grandes laços de amizade com ele. Ele retomou o descanso mais aquecido, e nós seguimos a nossa ronda.
Na paragem seguinte tentámos encontrar I, sem sucesso. Não havia sinais dela junto ao local onde costuma pernoitar, logo propusemos voltar lá um pouco mais tarde.
Rumamos então ao prédio em busca de R e B, na esperança de os encontrar bem. Quando os avistamos, ainda no carro, pareciam estar a discutir, dada a gesticulação. Quando os abordamos, percebemos que não se passava nada de alarmante. B informou-nos do seu novo emprego, falando dele com entusiasmo e esperança. A conversa direccionou-se para a vontade dos dois em arranjar casa, tendo estado o Pedro - o economista de serviço - a ajudá-los no cálculo e previsão das despesas de tal iniciativa. Como sempre, R mostrava-se céptica quanto à ideia, ao passo que o B mostrava-se bastante resoluto e optimista. Enquanto conversávamos com o B e a R (que parecia estar mais atenta à música do seu telemóvel do que às nossas perguntas), recebemos uma inesperada visita: o Sr. A. Estava bem vestido, bem cuidado, mas a solidão habitava tanto o seu rosto como o seu discurso. Pediu-nos algo quente para beber e algumas bolachas, falando-nos da sua intenção de se mudar para Lisboa nas próximas semanas. Pedimos-lhe que se encontrasse connosco antes de partir e que compilasse, como prenda de despedida, todos os poemas que gostava de nos escrever. Ele concordou com a ideia, mostrando-se até contente pelo interesse pela sua arte. Após alguns dedos de conversa com ele, com B e com R (que substituira a música do telemóvel pelos bocejos de sono), despedimo-nos todos com desejos de boa semana, antes de partirmos novamente em busca da I, tentativa que se revelou novamente infrutífera.
Na nossa última paragem visitámos o Sr. M. Desta vez, o seu sono era tão profundo que optamos por não o acordar, deixando os sacos junto à sua cama e acompanhados de um bilhetinho assinado por todos que continha desejos de uma boa semana.
Terminava assim mais uma ronda que, apesar de atípica, nos ensinou muito. É curioso sentir os valores de todas as coisas na nossa vida darem cambalhotas a cada ronda, fazendo-nos perceber que os melhores momentos da nossa existência provém da nossa relação com todo o tipo de pessoas, mesmo aquelas que parecem estar num cantinho de mundo esquecidas pelo mesmo. Mas por nós, nunca.

Luís Mouta Dias

1 comentário:

Anónimo disse...

LUÍS:

gostei muito! fico sempre com vontade de ter estado convosco...

abraço,