domingo, novembro 30, 2008

Nunca sabemos o que nos espera do lado de dentro. Mais um dia de visita à UHSA.

Mais um dia de visita à UHSA! A expectativa faz parte, sempre, de cada uma das visitas. Nunca sabemos, nem podemos, o que nos espera do lado de dentro. Nessa tarde éramos 6: o Nuno, o André, a Ana Pinho, a Valéria, a Amélia e a Mariana (euzinha).
      Conto-vos como é aquilo:
      Muros altos, impenetráveis; alta segurança inviolável; pessoas perdidas num mundo que lhes fechou a porta, por um momento, talvez, vamos confiar que sim!
      Quando entramos naquele sítio, temos a clara noção do vazio que transparece de cada olhar, da desconfiança como que a perguntar: "Quem são estas pessoas? O que pensam que vêem aqui fazer? Mudar a nossa vida? Resolver os nossos problemas pendentes? Ajudar-nos a ultrapassar estes obstáculos que a vida nos colocou, e que parecem tão intransponíveis? Que pensam eles? Que só porque cá estão a vida nos irá sorrir?".
      Por vezes é complicado sentirmo-nos tão impotentes, termos a noção que não basta um gesto, um sorriso, uma palavra, para que estas pessoas, concretamente, se encham de vontade de lutar, e encarem o mundo de outra forma.
      No dia 16 de Novembro, quando lá chegámos, o frio que lá fora se fazia sentir por momentos parecia que lá dentro se propagava.
      Eram bastantes os imigrantes que lá se encontravam detidos, 27, não sei, não consigo precisar ao certo. Mas cada um deles tinha o mesmo sentimento de distância e frieza para connosco. Desta vez foi bastante complicado para o grupo iniciar qualquer uma das actividades que nos propusemos dinamizar. Muitos estavam num seu mundo, solitário, com o olhar fixo e vazio na televisão; atentos, outros, a jogar cartas; e ainda outros fechados no seu silêncio, enfim…foi difícil.
      Desde logo deparámo-nos com a barreira da língua. Inglês quase ninguém entendia, o francês nós também não nos sentíamos muitos à vontade, até isto, nesse dia, não parecia estar muito a nosso favor.
      As nacionalidades eram muito variadas, desde um grande grupo de croatas; um russo; brasileiros; um senegalês; nigerianas; um italiano; um angolano; um afegão…
      Mas quem disse que dar tudo de nós, em troca dum ensinamento de vida e de um pequeno gesto é uma tarefa fácil? Não é! Aquelas pessoas, "plantadas" naquele lugar, distante do nosso mundo, sentem a falta da família, do seu país de origem…da sua LIBERDADE! Reagem com os outros com nenhum apreço aparente. E porque seria diferente? Não nos conhecem, nunca nos viram, não somos amigos, nem família, nem compatriotas, somos o quê? Para eles somos nós, simplesmente estranhos. Sabem que não temos o poder de fazer mudar o que quer que seja!
      Mas mesmo assim não desistimos e, de 15 em 15 dias lá estamos nós, nada nos demove, nem mesmo a conversa no silêncio nos faz fraquejar.
      Nesse dia começámos, como é habitual, pela música NoXuKuRéLá e, ao contrário de outros "tempos", poucos foram os que connosco vieram cantar, enquanto isso, outros encaravam tudo com distância.
      Vi, contudo, a emoção estampada na face do senegalês que, enquanto cantava, recordava, quem sabe, a sua terra, as suas lembranças tão dele e de mais ninguém. Bem! Parece que conseguimos, através da nossa música, aconchegá-lo, demos-lhe a possibilidade de se rever lá, naquele país distante em quilómetros mas tão perto de nós como de todos os outros. É esta a nossa missão, tentar mostrar-lhes que somos iguais a todos eles, que somos humanos, todos, sem excepção, que merecemos todos, igualmente, oportunidades, ser felizes, rir, chorar, sonhar, ansiar, pensar, abraçar…todos pertencemos à mesma essência, que é viver unidos, e à mesma existência que é a vida, o Nosso Mundo.
      Seguidamente tentámos fazer o jogo do novelo, a adesão, mais uma vez, foi pouca. Entretanto, parte deles já tinham virado as costas à nossa tentativa de aproximação. A iniciativa das etiquetas autocolantes, coladas em cada um de nós, e escritas com o nosso nome, para que possamos conhecer-nos melhor, pelo menos sabendo o nome de cada um, pois  a distância assim torna-se mais curta, também se mostrou complicada.
      O jogo das bolas parece que foi, na minha opinião, o mais aceite. Senti que foi um momento curto, mas que proporcionou alguma alegria.
      O jogo da mímica também ele teve pouca receptividade por parte de todos eles.
      Tomei, juntamente com a Amélia, a iniciativa de propor jogar cartas com alguns deles, divertimo-nos todos, foi giro, gostei!
      Por último, e antes de sairmos e dizermos adeus a todos eles, cantámos a música "Imagine", momento que idealizámos como perfeito para encerrar a nossa visita, mas que não foi igualmente muito participativo.
      Esta foi, então, a nossa tarde!
      Saímos todos com alguma tristeza, diria eu, desapontados por não termos conseguido unirmo-nos uns aos outros, por não termos conseguido criar o tal EU, uma só pessoa, a dita Humanidade, que somos todos nós, e que nos caracteriza por sermos um só…não interessa a cor, a nacionalidade, a língua, a religião, os costumes, os hábitos…nós não somos nós, nós somos EU…existe um todo…somos todos diferentes nas convicções mas iguais porque somos humanos, porque lutamos pelo mesmo, queremos porque queremos VIVER!
      Nunca é fácil aproximá-los de nós, nesse dia ainda foi mais difícil do que nos anteriores, mas também não podemos querer que nos abram os braços e nos acolham, assim sem mais! Podemos sim, e temos essa liberdade, ficar na expectativa de…eles se aproximarem…de se mostrarem um pouco mais…
      São pessoas amarguradas com a vida, com uma grande relutância em aceitar os outros.
      Tiro uma lição de vida desta visita e desta experiência que é o FAS  Imigrantes: "Quero continuar a fazer parte deste grupo, que é um todo, unido num mesmo propósito, dar sem esperar receber nada…dar sem querer obrigatoriamente receber. E quero acreditar que, nem que seja por 5 minutos, a nossa presença faz toda a diferença. Há que esperar que num dos dias, sem que estejamos à espera, recebamos do outro lado uma palavra, um gesto, um ensinamento para toda a vida!".
Mariana


1 comentário:

Anónimo disse...

MARIANA: que bom e que bem que nos recordas a visita. foi mesmo difícil, mas tu deste-lhe um sentido. obrigado e beijo,