Contratações de inverno!
Maria Freitas
Famílias, Aldeias e Sem Abrigo estas são as nossas áreas de acção. Um grupo de jovens do Porto, que no CREU têm uma casa, lançam mãos aos desafios que lhes surgem.
Contratações de inverno!
Maria Freitas
Os meus heróis do voluntariado
F. é visita regular de muitos toxicodependentes. Há anos que palmilha, com os colegas, o Bairro de São João de Deus, que bem poderia chamar-se Bairro do Fim do Mundo, Bairro do Apocalipse ou, simplesmente, o Inferno.
A reportagem realizada em 2005 (mas tão actual e recentemente exibida numa formação) mostra-nos farrapos humanos que vivem na mais absoluta miséria e rodeados de imundice. Vivem em barracas com lixo por todos os lados. E com os traficantes de droga sempre por perto.
Picam-se várias vezes por dia, alimentando o vício maldito da heroína. Desesperados, amarram qualquer coisa ao braço (uma corda, um cinto...) em busca da "veia amiga", que ajude a rapidamente receber o imundo veneno que, há anos, os escraviza e os afastou da família, emprego e amigos. E os reduz a seres de quem fugimos, quando os vemos, por vezes.
Os técnicos/voluntários a tudo assistem com uma impressionante calma, procurando estabelecer pontes, passo a passo. Primeiro, com o fito de recolher as seringas e de as trocar por novas (e descartáveis), diminuindo os riscos de propagação de SIDA e Hepatites.
Depois, ganhando a pouco e pouco a confiança e, mais tarde, tentando tirar este ou aquele do "buraco" e o levar a uma consulta, a um internamento, quem sabe, a um tratamento com sucesso.
Se não é para qualquer um ver o documentário, muito menos é para qualquer um lidar com isto todos os dias, anos e anos a fio. Estar a conversar com os tais "farrapos humanos" a picar-se, com a seringa pendurada no braço é muito duro de se ver.
Foi um grande murro no estômago que levei. Pensarei duas ou três vezes antes de dizer que tenho problemas.
Estes técnicos/voluntários têm uma coragem, dedicação, paciência e fé verdadeiramente impressionantes. Por isso são os meus heróis do voluntariado!
Miguel Coelho
Na reunião mensal de Dezembro tivemos a presença da Dr. Teresa, da V. N., quem teve a amabilidade de partilhar connosco um pouco da sua vasta experiência profissional de acompanhamento de pessoas e famílias carenciadas.
Não obstante o carácter voluntário do serviço que prestamos, pretendemos fazê-lo em moldes profissionais: com pleno comprometimento e dedicação, numa perspectiva de melhoria contínua. Acreditamos que só assim é possível promover a confiança e respeito das pessoas que visitamos e no limite, a melhoria do seu Bem-Estar.
A definição de objectivos e a delegação da responsabilidade na(s) pessoa(s) que acompanhamos, as quais tem que sofrer as consequências dos seus actos, foi apenas o mote para o inicio da conversa com a Dra. Teresa. O respeito mútuo entre voluntário e família foi enfatizado como premissa fundamental para o desenvolvimento deste tipo de relação.
A colocação de um "interesse desinteressado " nas nossas acções foi referida como essencial neste tipo de trabalho. Apesar do estreitamento das relações entre voluntário e família, que a frequência das visitas possa induzir, é indispensável um prudente afastamento afectivo, para evitar que o nosso bom desempenho, como voluntários, seja posto em causa.
O tempo foi curto para a riqueza das informações e dos conselhos de quem convive diariamente com pessoas em risco e reflecte sobre as suas dificuldade e possibilidades de superação.
Muito obrigada à Dra. Teresa, cujo sentido de missão nas funções profissionais que desempenha, nos comovem e inspiram. Obrigada por, dentro do amadorismo do voluntariado, nos ajudar a ter uma atitude cada vez mais profissional e a prestar um melhor serviço às pessoas que acompanhamos.
Ana
Mais uma quinta-feira de Novembro. O dia estava frio e já era noite.
Eu e a Sofia acertámos os passos e descemos a rua. Tínhamos ainda na cabeça muitas preocupações feitas de papel e a pressa de viver tudo ao correr da tinta.
Rapidamente chegámos. Batemos à porta e o sorriso da F. recuperou a nossa atenção. Olá, lindas. Entrámos. A sala estava muito limpa e arrumada. Por trás das cortinas azuis, a janela aberta era a continuação da rua. Passavam pessoas. Muitas. Algumas espreitavam. Da cozinha vinha um cheiro doce e quente, que se misturava com a atmosfera fria da sala. Eu não tenho frio, sou lá de cima. E não tinha.
Dividimos uma cadeira e começámos a falar.
Contámos a vida, os planos, o amor, o futuro. Tentámos ajudá-la a concretizar os projectos. Rimos e sonhámos. Falámos de perdas e desilusões também.
E o tempo passou a correr. E quando nos despedimos, já não era em trabalho que pensávamos...
saímos mais...
Foi mais um fim de tarde de Novembro. Mas naquela quinta-feira, entrámos duas mas saímos mais...
Maria João e Sofia
Ser voluntário, ajudar os outros é bem mais complicado do que alguns possam pensar: é necessário estar presente sem concordar e entender, é preciso apoiar mesmo quando sabemos que esse não será o melhor caminho. É assim a nossa história, uma história com voltas e reviravoltas constantes de idas e chegadas. Mas como um verdadeiro amigo, como uma mãe ou um pai acolhe o filho pródigo, também um voluntário tem de ter sempre o coração aberto para acolher os outros.
O senhor J.C. habituou-nos ao seu sorriso sempre aberto, a uma prontidão e vontade tais para resolver a sua vida que até para nós servia de exemplo, ao seu intersse e preocupação connosco: "mande-me um toque quando chegar a casa!" "Veja lá, não apanhe frio"! Mas um dia, num telefonema inesperado diz-nos "vou viver para outra cidade, vou viver com um antigo amor!". Ficámos com receio, achámos precipitado e até disparatado, tememos pela sua saúde e por uma nova desilusão na sua vida. Mas apoiámos, tentando perceber a situação, conversando com ele. Parecia mais feliz que nunca!
Foi-se embora. Passado poucos dias já estava a ligar dizendo que ia voltar, porque tudo tinha corrido mal. Nós ouvimos e apoiámos, tentando perceber como iria fazer para alugar novamente um quarto, oferecemos a nossa ajuda para tudo o que precisasse. Porém, passados uns dias o nosso amigo voltou a dizer-nos que afinal não regressaria ao Porto, que já estava tudo bem e que ficaria a viver com o seu amor antigo. Desta vez pensámos que a sua partida seria definitiva.
Passaram uns meses, com uns telefonemas difusos de vez em quando. Acreditámos que o Senhor J.C teria encontrado um rumo definitivo na sua vida, chegámos mesmo a sentir o sabor da "missão cumprida". No entanto, há uns dias ligou-nos, dizendo que já está no Porto, que a sua saúde piorou imenso, que terá de ser operado e que tudo não passou de um erro. E nós? Nós, cá estamos, de braços abertos, para apoiar aquele que se tornou um amigo, na incerteza constante, mas sem moralismos, sem opiniões, apenas dando um pouco do nosso tempo, atenção e amor a quem carece tanto deles…
Sofia e Cecília
O Inicio do ano (lectivo) tem sempre um sabor muito especial: recuperámos as forças e enchemo-nos de expectativas para o novo ano. Voltamos a acreditar que podemos mudar o mundo com mais força e muita criatividade. Mas tenhamos sempre presente que o mundo de cada pessoa só pode ser mudado pela própria, e que o voluntário só tem o privilégio de testemunhar e apoiar num processo de desenvolvimento pessoal (cheio de pequenos progressos e de inúmeros recuos). A possibilidade de caminhar ao lado e assistir a alguma melhoria no Bem-Estar das pessoas que acompanhamos é, provavelmente, das experiências mais recompensadoras que podemos viver.
O desafio do FasFamilias é muito simples: "Estar!", ou melhor ainda, "Estar para"… quem precisa…; quem não tem…; quem tem , mas não sabe utilizar …; quem não sabe sequer que tem…; e frequentemente, para quem se sente só …. . Em suma Estar para aqueles, cujo dia a dia é duro e difícil, por inúmeras e variadíssimas razões. Apesar do conceito "Estar" parecer envolver alguma inércia, O "Estar para" que os voluntários das famílias vivenciam, pressupõem uma atitude atenta e verdadeiramente empenhada no desenvolvimento integral das Famílias que acompanham. O desafio está lançado! Será que podemos contar contigo?
Ana
Diogo CostaNo mundo de Diogo Costa há tempo reservado para ajudar o próximo. Em Setembro de 2007, o estudante do 3º ano do Mestrado Integrado em Engenharia Electrotécnica e de Computadores da FEUP decidiu ingressar no grupo FASRondas - (Famílias, Aldeias e Sem-abrigo). O grupo de jovens voluntários do Porto desenvolve trabalhos de acção social junto dos mais carenciados. O FASRondas foi fundado em 2003 por um pequeno núcleo de voluntários, tendo vindo a crescer desde então, contando actualmente com cerca de 80 membros. Diogo Costa faz parte da vertente "Aldeias", que presta apoio a terras próximas da serra do Marão, como Candemil, Ansiães, Basseiros e Bustelo. Pelo menos uma vez por mês, está com pessoas que "só precisam de facto de alguma companhia, de nada mais".O aluno da FEUP partilhou um pouco da sua experiência no grupo FASRondas com o ADN FEUP (ver mais)