Envoltos num quase silêncio das montanhas do Marão, já longe do buliço da cidade, é tempo de estender a toalha na relva e preparar a barriguinha para mais uma tarde de missão. Rissóis, pizza, bolinhos… temperam uma amena conversa, desta vez só no feminino, e bem!
Tudo a bom ritmo, pois é preciso visitar a D. Aurélia, que por impedimento dos voluntários de Candemil teve de ser assegurada pelos das restantes aldeias. Sem uma visita, ainda que breve, é que não poderia ficar! Sempre cheia de vida a nossa nonagenária! O passeio da paróquia desta vez não a convenceu... muito calor, a missa por um familiar… razões bastantes para ficar por terra desta vez. Afinal, parece que o maior interesse destes passeios "é mais comer que outra coisa!" Numa breve conversa e apesar da nossa pressa, ainda nos contou como "Deus nos fala por pequeninas coisas".
Separam-se os voluntários, eu e a Cláudia dirigimo-nos para Ansiães. A tia Rita já está à nossa espera! Sempre airosa e com um sorriso acolhedor ou não fosse um dos seus maiores ensinamentos: "não devemos incomodar os outros com o nosso mau humor e além disso não nos serve de nada a má disposição!" Contudo, não deixou de nos partilhar algumas das suas preocupações. Movimentos de dinheiro pouco claros no banco levaram a uma conversa longa ao telefone com a nora, além disso a crise cardíaca que a conduziu há tempos ao hospital ainda necessita de medicação. Como se não bastasse, a bronquite está também a precisar de uma atenção especial! Com tudo isto, como lhe explicar, não podendo ela ler, como tomar seis medicamentos com regimes posológicos completamente diferentes: uns a horas certas, outros à refeição, outro ainda começam com uma dose mais forte que depois vai diminuindo!!! Tentando simplificar o mais possível e repetindo várias vezes lá tentamos ajudar, mas de facto o melhor conselho que podemos dar creio que foi o de pedir ajuda na vizinhança!
Subindo a ladeira, à sombra dos castanheiros e aproveitando cada pequenina brisa para refrescar, encontramos a D. Aldina, sempre com um sorriso meigo, acompanhada de duas vizinhas. Juntamo-nos ao trio e ali estivemos a conversar de temas vários. Apesar de tudo pareceu-nos mais tranquila, talvez por o filho estar mais por perto.
Por fim, e não sem antes nos refrescarmos com a água da fonte, é altura de partir para o lugar do Casal onde vive a D. Ondina. A nossa chegada veio substituir a televisão que ressoava enquanto esperávamos que nos abrisse a porta. Mais uma vez tivemos de fazer uma pequena introdução, a D. Ondina ainda não tinha compreendido bem que não temos nada que ver com a associação para a qual ela contribui e que lhe traz as refeições. "Nós só visitamos pessoas sozinhas e não recebemos nada por isso". Uma lógica difícil de compreender nos nossos dias, é verdade!!! Uma vez convidadas a sentar só precisamos introduzir o tema, sempre muito faladora ela própria conduz a conversa. Os temas de história parecem ser um dos preferidos. "O meu marido lia num livro e contava-me. Sim, porque nós já fomos dos espanhóis. Mas, um dia, estavam os homens no campo de batalha e os espanhóis tinham a nossa bandeira que não nos queriam dar. Até que um português foi lá e zumba retirou-lhes a bandeira e atirou-a para o nosso lado. Claro que ele já sabia que ia morrer, mas às vezes é preciso assim uns homens animosos! E foi assim que Portugal conquistou a independência."
E foi assim mais uma tarde de missão, de combate à solidão, de conversa em conversa, de troca de sorrisos, de simplicidade em simplicidade…
Marta Rego | Ansiães
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