terça-feira, maio 25, 2010

Crónica das Aldeias 08.05.2010

Sábado, 8 de Maio

Já passava das 11h30 quando os carros deixaram o Porto rumo a mais uma missão nas aldeias. Atrasados como sempre. Cheios de comida também. Até aqui nada de novo. Excepto o sangue novo: Maria João, Ana e Lúcia (Esta é apenas uma de muitas apresentações que vamos ter que fazer ao longo do dia, quem sabe dias, semanas talvez). Também pouco importa o nome. Faz falta é gente com vontade de ajudar. E isso não falta no FAS.

Vamos identificá-los pelas aldeias, talvez seja mais fácil (Ansiães, Basseiros, Bustelo e Candemil). Chega a haver uma espécie de competição saudável: "A minha aldeia é melhor que a tua". Mas não há prémio. Um sorriso do outro lado basta para confortar a viagem de 70 quilómetros até Amarante.

Hoje é dia do Grupo B fazer a habitual visita às aldeias. Hoje é dia de visita no feminino. Hoje é a nossa segunda vez. Se a primeira foi difícil? Não. Fomos recebidas de braços abertos pelo grupo e pelos idosos. "Vinha um pouco receosa, mas fui muito bem recebida. Hoje já me senti em casa", conta Lúcia. "Estava indecisa em ir para os séniores e não fui, porque gostei da experiência", continua Maria João. A jovem enfermeira gosta do convívio, da experiência que os idosos transmitem, das expressões que utilizam.

"Tive a sorte de ter elementos óptimos, bem-dispostos, faladores. São muito bem-vindos. Trazem uma boa energia ao grupo", diz Margarida, outra voluntária, nestas andanças desde o início do ano.
Até agora tudo bem. Ninguém quer desistir. Durante a viagem, até se discutem ideias novas para dinamizar as visitas.
O dia está cinzento. A chuva parece não dar tréguas. A temperatura ronda os 10 graus. Hoje, o habitual almoço de partilha terá que ser na varandinha da Associação de Candemil, que serve para acomodar quiches, rissóis, folhados, pizza e muitas outras iguarias. (Por favor não tragam mais rissóis). Quiches e bolos caseiros aceitam-se. (Maria João, o bolo não estava mau, mas se estivesse um bocadinho menos seco …)

São 14 horas. É tempo de ir levar um pouco de nós aos idosos das aldeias. Em Basseiros, reina o silêncio. Não se vê vivalma nas ruas. Está frio, chove. O tempo não convida a grandes passeios. Foi à porta de casa que encontramos a Dona Celeste. Há duas semanas estava na eira, com a cunhada, as amigas e as vizinhas.
Cantou para nós, contou histórias do tempo em que casou, mostrou a fotografia do vestido de noiva que envergou. Hoje paira-lhe uma tristeza maior. O tempo não ajuda. As pernas e o coração também não. Esta semana passou mal. Falou das maleitas dela e dos outros. Nós ouvimos atentamente. Agradeceu a visita. Sorriu. Missão cumprida.
Próxima paragem: Dona Dulce. "Está a dormir. Está muito cansada", justifica o marido, que tão bem receber sabe. Teve de ir ao hospital. Mais um problema de rins. Deixamo-la descansar, enquanto o marido explica como ela tem passado desde a última visita. Das maleitas, rapidamente a conversa estende-se aos telemóveis da nova geração e às famílias de antigamente.
A dona Dulce é irmã da dona Arminda (visitamos regularmente também). Casaram com dois irmãos. "Naquela altura era mais normal casarmos aos pares", conta a rir o marido da dona Dulce.
A cunhada, que soma mais de 80 anos de vida, faz-lhe companhia. A única coisa que perdeu foi a visão. Tudo o resto o tempo não levou. Espalha boa-disposição, simpatia e muita sabedoria que só o povo conhece:

"Eu pedi a morte a Deus,
Ele disse que não me dava,
Que lhe pedisse antes a vida,
Que a morte certa me estava", conta com boa-disposição.

A visita hoje foi curta (algumas idosas não estavam na aldeia e outras não nos puderam receber). Mas não damos a viagem por perdida. Lembram-se do sorriso da Dona Celeste? E do ditado popular da Dona Arminda? Nós também. E, por isso, vamos voltar.

17 horas. É tempo de fazer o balanço da visita de hoje. No momento de partilha lembramos o Jorge. As idosas também não o esqueceram. Ainda hoje perguntam por ele. Rezamos por ele, que está algures no Quénia. No final, não resisti: "Desculpem, quem é o Jorge"? Todos riram. "O Jorge é um dos fundadores e impulsionadores do projecto". Esclarecida. Um bem-haja ao Jorge por iniciativas como esta.

P.S.Desculpem se exagerei nos pormenores. Tenho vontade de descrever tudo. É tudo novidade. Cada sábado é uma descoberta.

Ana Oliveira | Basseiros

3 comentários:

Sara disse...

Ana, belíssima crónica!

Revivi o dia como se fosse hoje :-).

Muito obrigada.

Um beijinho a todos!

Adriano disse...

Finalmente uma crónica sucinta!

E já repararam que a letra com que começa cada parágrafo não é repetida ao longo das letras iniciais dos restantes parágrafos da crónica? Coincidência!? Naaaaaa... PROFISSIONALISMO! :)

Foi com textos tão bem redigidos e de avaliação peculiar como este, que se começou a dar valor às obras camonianas. ;)

Agora a brincar... Parabéns Ana!

bjinhos

doidas disse...

Obrigada. É para isto que me pagam e bem:)

O senhor engenheiro fala, fala, fala, mas marcar o jantar nem vê-lo:)