sexta-feira, outubro 30, 2009

Crónica Boavista – 25.10.2009

Foi há um ano que entrei para o FASrondas, mais propriamente para a vertente dos Sem-abrigo.
Durante este ano os meus domingos à noite foram preenchidos com encontros e desencontros com aqueles a quem um dia a vida pregou uma partida. Sim, porque também há desencontros: o Sr. Ar que nem sempre estamos com ele e que há 2 meses que tem agrafes na cabeça e ainda não os foi tirar; o Sr. An que não encontramos há já muito tempo e que da última vez que estivemos com ele estava completamente embriagado; o ZC que anda sempre a correr para ajudar a estacionar mais um carro ou até com flores na mão para vender e assim arranjar mais algumas moedas. Mas também há os encontros com a partilha da semana, com os sorrisos que encontramos apesar da vida que levam. E são tantos os sorrisos que recebemos… O JP que esta muito mais comunicativo; o Sr. Al que está sempre a nossa espera; o Sr. G que continua com as suas mezinhas; a D. Fátima que passou a dormir na rua por causa dos ratos que estavam na sua barraca e que continua a espera de uma casa; o Sr. Z que tem andado mais triste desde que foi “desalojado” do seu T0+0 (como ele mesmo dizia) e que neste domingo recebeu a boa notícia de que a bicicleta que dois polícias lhe tiraram vai-lhe ser devolvida por ordem do tribunal; a D. G que já obteve o 9º ano pelas Novas Oportunidades e que continua entusiasmada e com vontade de apostar na sua formação a informática e também a obter o 12º ano. Foi e são assim as noites de domingo…
E, como sempre, o que não se diz, não se escreve, sente-se!

Manuela Seixas

quinta-feira, outubro 29, 2009

Crónica da Ronda da Batalha - 18.10.2009

Olá a todos
Chamo-me Francisco, e estou nas Rondas desde Abril deste ano. E embora o receio de não ser capaz de cumprir a tarefa me tivesse assaltado antes de a começar (por nunca a ter feito), a verdade é que as palavras que o Jorge me dirigiu na sessão de esclarecimento se revelaram muito verdadeiras. Dizia-me ele que se eu tinha MESMO vontade de fazer este género de voluntariado, ainda que  pensasse não ter a capacidade de o fazer, o melhor era lançar-me em frente, e talvez viesse a descobrir que afinal as ferramentas já cá estavam, eu é que as não conhecia.
Durante este tempo ganhei amigos e amigas, no FAS e na rua, e tenho descoberto todas as noites de Domingo (mas também durante a semana) o que é afinal isto de ser voluntário, quer nos bons momentos de boa conversa e sorrisos, mas também (e sobretudo) quando as coisas não correm como desejaríamos, quando as dificuldades aparecem. Para mim, tem sido precisamente aí que tenho descoberto quais são realmente as ferramentas que eu e todos temos (ou desencantamos) para fazer face aos silêncios, ao sofrimento, à vida dos amigos que encontramos na rua.
No início encontrámos o N. Costuma estar sozinho, no seu lugar habitual, mas hoje estava com outra pessoa. O N. tem 25 anos, é toxicodependente, e deixou a casa dos pais já há alguns anos, e conhecemo-lo há alguns meses. Diz-nos que está farto desta vida, que quer mudar, que já está à espera de uma vaga numa comunidade. No N. chamou-nos sempre à atenção o factor idade, e a possibilidade de uma vida que o mesmo ainda tem pela frente. Insistimos com ele para não desistir de se tentar tratar. Um dia encontrámo-lo tão em baixo, que ficámos cerca de 1 hora a conversar com ele, e o tempo passou quase sem darmos por isso, com poucas palavras, mas com a nossa presença e a procura de deixar alguma luz de esperança. Hoje essa esperança parece maior. Despedimo-nos com trocas de sorrisos, e um obrigado.
 Depois, fomos ter com o Sr. F., que tem 57 anos, e tem problemas de alcoolismo. Embora não muito conversador, conseguimos, na última semana, bater o record de tópicos de conversa abordados. Sendo a nossa intenção unicamente ganhar o "à vontade" das pessoas para melhor as poder ajudar, o desenrolar de algumas perguntas foi o suficiente para ouvirmos do Sr. F. algumas coisas da sua vida passada e presente, com algum humor à mistura. É visível uma grande revolta do Sr. F. para com a vida e o mundo, mas também já vamos sentindo que a nossa presença vai contando para ele nestas noites. Nesta, porém, encontrámo-lo a dormir profundamente, e depois de algumas tentativas para nos ouvir, assim o deixámos.
A seguir encontrámos o Sr. F., já conhecido desta ronda há anos, mas que presentemente tem a sua situação ainda mais complicada. O Sr. F. tem vivido num conjunto de papelões onde guarda todas as suas coisas, com uma higiene muito deficiente, e sabemos nós, com uma alimentação também ela limitada. Sofre de esquizofrenia, e alterna momentos de lucidez, com aqueles em que se embrenha nos seus escritos e histórias que dificilmente conseguimos compreender o sentido, e outros momentos em que o álcool faz a sua entrada. No entanto, recebe-nos sempre de uma forma simpática, gentil mesmo, e se não nos quer junto dele naquela noite, diz-nos que se quisermos não temos que ficar, que sabe que temos que ir ter com mais gente que precisa. Hoje estava fora do seu local habitual, porque junto ao seu sítio abriu um Hotel e uma loja, que o obrigaram a ficar sem sítio, e assim vagueia pelo passeio abaixo e acima, na rua. Encontrámo-lo lúcido, mas apreensivo com o que está a acontecer, para além de não conseguir dormir por o lugar onde está ser inclinado. Falámos-lhe então da hipótese de ir para uma habitação. Estando há tantos anos na rua, e à espera de uma resposta negativa, surpreendeu-nos com um sim, tal o medo que sente neste momento. Dissemos-lhe que, sem compromisso, iremos ver as possibilidades. No final, oferecemos-lhe um chá quente, que agradeceu com um sorriso a que já nos habituou, e que nos aquece o coração. Disse-nos que tinha sido uma boa ideia. Despedimo-nos.
Para terminar, rumámos até junto do J. Outro rapaz novo, também toxicodependente, que na semana passada fez anos, mas que não encontrámos. Desta vez sim, demos-lhe os parabéns, e ele brindou-nos com a notícia de que se inscreveu no programa da metadona. Já será um começo. O J. é de Estarreja, fez 31 anos, e até há algumas semanas estava acompanhado de um irmão, também visitado por nós naquele mesmo sito, o L, mais velho, e que presentemente está preso em Aveiro por acumulação de multas de comboio sem pagar. "Pecados" inevitáveis devido ao sorvedouro de dinheiro que é canalizado para uma dependência sempre acima de necessidades básicas como alimentação ou transporte para visitar a família. Ambos ainda a têm em Estarreja. Perguntamos ao J. pelas suas filhas que lá estão, e disse que as visitou no seu dia de anos. Aqui sentimos que não são muitas mais as ferramentas que temos, que a nossa presença e o nosso conselho são praticamente o que de melhor podemos fazer. O mais importante terá que ser feito por eles.
No fim da noite, encontramos outro caso semelhante ao do J. Trata-se do P., com 36 anos, que costuma andar nas suas lides de arrumador também por aqueles lados. Uma personalidade mais complicada de entender, mas que mesmo tendo a noção de que nem tudo o que diz é exacto, sabemos que a nossa presença pode ajudar a alterar alguns comportamentos, e quem sabe, como uma gota num regato, encaminhar para uma mudança que poderá ocorrer mais cedo ou mais tarde, mas que não podemos prever.
Até Domingo.
Francisco

segunda-feira, outubro 19, 2009

Crónica das Aldeias 10.10.2009

Olá =)
Eu sou o Diogo, desde Setembro de 2007 que faço voluntariado nas Aldeias, entrei para o FAS, para uma experiência diferente, Ser Voluntário!, desde então, que acordo, aos sábados, de quinze em quinze dias, ou uma vez por mês, para algo diferente, para algo que sei que aquele dia vai ser para aquilo, e sobretudo para aquelas queridas pessoas. Lembro as primeiras vezes que visitei as aldeias, toda aquela cumplicidade que já se sentia,... os rituais,... algo que ainda hoje é assim... e que é sempre bom e é sempre novo, de cada vez que fazemos mais alguns quilómetros até lá, conversas na viagem, o almoço, o cafézinho ou então a sorna, depois a partida para as nossas queridas senhoras, depois um encontro e a partida para o Porto... isto é mesmo giro...
Gostava hoje de partilhar uma história que me lembro muitas vezes durante as nossas visitas... os rituais...

O principezinho voltou no dia seguinte.
- Era melhor teres vindo à mesma hora - disse a raposa. Se vieres, por exemplo, às quatro horas, às três, já eu começo a ser feliz. E quanto mais perto for da hora mais feliz me sentirei. Às quatro em ponto já hei-de estar toda agitada e inquieta: é o preço da felicidade! Mas se chegares a uma hora qualquer, eu nunca saberei a que horas é que hei-de começar a arranjar o meu coração, a vesti-lo, a pô-lo bonito.
São precisos rituais.
- O que é um ritual? - perguntou o principezinho.
- Também é uma coisa de que toda a gente se esqueceu - respondeu a raposa. - É o que faz com que um dia seja diferente dos outros dias e uma hora, diferente das outras horas. Os meus caçadores, por exemplo, têm um ritual. À quinta-feira, vão ao baile com as raparigas da aldeia. Assim, a quinta feira é um dia maravilhoso. Eu posso ir passear para as vinhas. Se os caçadores fossem ao baile num dia qualquer, os dias eram todos iguais uns aos outros e eu nunca tinha férias.
- Adeus - disse a raposa. - Vou-te contar o tal segredo. É muito simples: só se vê bem com o coração. O essencial é invisível para os olhos.
- O essencial é invisível para os olhos - repetiu o principezinho, para nunca mais se esquecer.
[Saint-Exupéry, O Principezinho]


Muitos conhecem... mas é mesmo isto... Chegamos a Casa da D. Alda, chamamos cá de fora... e lá está ela... à nossa espera...
Com a D. Aurélia... nem precisamos de ir ter com ela... encontra-nos sempre, sabe sempre por onde estamos e por onde vamos,...
Com a D. Maria do Carmo... lá está ela... com a sua mantinha sobre as pernas à nossa espera na entrada da sua casa... e é isto... é este o ritual que nós levamos... para estas senhoras... é o bastante... saber que nós lá vamos... para poderem vestir o coração com um sorriso, e "É o que faz com que um dia seja diferente dos outros dias e uma hora, diferente das outras horas."
Aproveito também a crónica para lembrar a D. Cândida... e as suas histórias, e os seus suspiros...
Na última visita foi um dia de muitas recordações, falamos de quando começou o grupo a ir às visitas... a D. Alda lembrou todos os rapazes que por lá passaram nas visitas... o Tiago, os "Joões", o Nuno... das meninas também se falou...
no meio da conversa... falamos de política (eram as autárquicas no dia a seguir), notou-se ali entre a D. Alda e a D. Aurélia, umas pequenas divergências de opiniões, mas ambas sabiam em quem votar no dia a seguir, foi então que eu e a Isabel, decidimos desafiar a D. Alda e a D. Aurélia a um pequeno passeio, que acabou por ser bem maior do que eu julgava, a D. Alda, afinal estava cheia de força, e queria ir sempre "mais ali à frente" dizia ela que já não fazia aquele caminho à muito tempo, e a D. Aurélia... sempre fina... nem parece os seus 94 aninhos, não imaginam o quão forte ela é... é uma grande mulher.
Por fim fomos visitar a D. Maria do Carmo, e como é claro, acompanhados pela D. Aurélia, ali... a conversa rolou muito bem entre elas... enquanto eu aproveitei também para por a conversa em dia com a Isabel =)
Foi assim... mais um dia... um dia marcado pelas recordações, e pela força de jovens senhoras que visitamos.
Com muito mais a dizer... mas talvez fique para uma próxima...

diogoCosta

sábado, outubro 10, 2009

Crónica da Ronda da Areosa - 4.10.2009

Ser voluntário

Em vez do formato habitual, decidi escrever-vos sobre o que é para mim ser voluntária nos Sem-Abrigo.

1º - é preciso muita entrega e vontade

2º - mais ouvir do que falar

3º - compromisso

4º - estar lá

Depois desta lista parece difícil tudo o resto… mas na verdade é muito fácil… Desde que comecei a fazer rondas, há mais de 2 anos, que não paro de me surpreender com tudo o que acontece à minha volta e com tantos sorrisos e tantas lições que as pessoas que visitamos nos dão. Fui percebendo que as ligações que se criam são muito fortes e que essas pessoas também se interessam por mim, por saber que eu estou bem! Assim, depois de cada Domingo e antes de me deitar, penso em tudo o que aquela ronda me trouxe… é verdade que umas vezes me deito mais contente do que outras mas no Domingo seguinte lá estou para mais uma conversa, mais um copo de leite, mais um monte de novidades ou de notícias repetidas… para visitar os amigos da rua!

Maria Freitas

quinta-feira, outubro 08, 2009

Crónica das Aldeias 26.09.2009

Olá a todos!

Eu sou a Joana, a mais nova do grupo de visitantes das nossas queridas tias e, se não me engano, tio de Amarante.
Depois de já dois meses de férias, regressei às Aldeias. Apesar de um regresso um bocado confuso, pois só consegui ir ter a Amarante depois do almoço, estava bastante entusiasmada por conhecer as novas senhoras de Ansiães (a "minha" Aldeia). Fui com a Marta e o Adriano e começámos logo pela D. Ondina, uma senhora fora de série, cheia de energia, que falou literalmente a visita toda. Entre política (estavamos em véspera de eleições), mortes, a sua enorme família (tem 8 filhos a viver entre Porto, Lisboa, Algarve e França) e ensinamentos linguísticos, foi difícil conseguir acompanhar o ritmo speedado desta engraçadíssima senhora. Para terminar em beleza, espetou-nos aos três 4 beijos "à francesa" , disse-nos ela.
Em seguida, fomos a casa da D. Aldina, também a minha primeira vez, e fomos recebidos com um enorme sorriso desta tia sentada na varanda a apreciar a vista e o alto dia de sol que estava. Conversámos um bom bocado e tratou-nos como se fossemos da família. Insistiu imenso para que bebêssemos a água pura da fonte ao lado da sua casa.
Já atrasados, fomos bater à porta da Tia Rita (por quem eu tenho uma especial empatia, se me é permitido) que estava a lanchar. Ficou furiosa por só estamos a vir agora, já pensava que não vínhamos. Ao contrário das outras tias, a Tia Rita é completamente autónoma e é ela que cozinha e limpa a casa. Além disso, tem a vida toda organizadinha e por isso não gostou muito que lhe viéssemos interromper o lanche. No entanto, depois de nos por na linha, insistiu imenso e lá nos ofereceu um chá de hortelã divinal. Conversámos sobre as eleições, o seu amor (irónico) ao Sócrates, entre outras coisas. O que teve mais piada foi o facto de achar que conhecia o Adriano de algum lado, dizia ela: "Eu tenho a certeza que já vi alguém igual a ele". Sem chegarmos a nenhuma conclusão, tivemos de sair à pressa, porque ainda nos faltava a D. Carminda, com a promessa de na próxima visita estarmos lá às 15h.
Com a Tia Carminda já não conseguimos estar muito tempo, mas ainda conseguimos trocar umas palavras com ela e com os familiares que estavam. Não falou muito, porque estava fraquinha, mas surpreendeu-me carinhosamente com um beijinho na mão. Sentir as mãos daquela senhora, com aquele sorriso encheu-me o dia!
Cansados, mas felizes, juntámo-nos a grupo que nos esperava em Basseiros a comer uvas.
Conversámos um bocado e despedimo-nos cada um de volta ao seu dia-a-dia, mas sempre com estas senhoras connosco, prontos para voltarmos daqui a um mês ou até antes...


Joana Leite de Castro | Ansiães

quarta-feira, outubro 07, 2009

Sessão de Esclarecimento

Sessão de esclarecimento a novos voluntários:

Dia 08 (quinta-feira), às 20h no CREU.

Se estás interessado(a) em fazer voluntariado, aparece!

Vem conhecer-nos!

Podes enviar um e-mail para:

fasrondas@gmail.com