quarta-feira, janeiro 25, 2006

1ª Crónica de 22.01.2006 (Boavista)

Este domingo, o grupo estava um pouco mais reduzido, mas nem por isso a vontade de iniciar a nossa jornada semanal esmoreceu. Muito pelo contrário: partimos cheios de esperança no coração!
A nossa primeira paragem foi em Damião Góis e foi também a primeira vez que lá fomos. Fomos conduzidos pela Joana que mora ali perto e que contou ter visto um senhor que dormia nas arcadas de um prédio naquela zona. Chegados ao local, deparámos com uma pessoa completamente tapada para tentar refugiar-se do frio e, por baixo daquele cobertor velho, encontrámos um senhor muito simpático que nos recebeu com um sorriso enternecedor. Enquanto bebia um cafézinho, disse-nos chamar-se B., é natural de Trás-Os-Montes e é também muito viajado. Já esteve em Espanha e França a trabalhar e diz querer voltar para Espanha na Primavera porque, como ele afirmou: “Em Espanha é que é bom! Em Espanha está-se muito melhor do que aqui!”. Foi também aqui que vieram ter connosco dois rapazes (o André e o Nuno) que nos perguntaram se estávamos a ajudar as Pessoas Sem-Abrigo e se era “tudo pago do nosso bolso”. Como respondemos que sim, eles disseram de imediato que nos queriam ajudar, deram o contacto ao Jorge e ficaram de ir juntos, quarta-feira, dar umas voltas pela Lapa para tentar encontrar possíveis novas paragens. Esperemos que este reconhecimento do terreno corra bem e que já haja boas novidades na reunião de quinta-feira. Quando viemos embora, o Sr. B. ficou a ver-nos entrar no carro sem nunca desviar o olhar e brindou-nos com um aceno e um sorriso enquanto arrancávamos para mais uma paragem.
De seguida, fomos tentar encontrar um senhor que o Jorge já tinha visto a dormir na rua, em Faria Guimarães. Não demorámos muito a encontrá-lo. Não aceitou café, mas desde logo foi muito simpático connosco. É bastante falador e, “aproveitando-se” de lhe termos dito que tínhamos todo o tempo para o ouvir, iniciou uma conversa que durou aproximadamente uma hora. Ficámos a saber que se chama J., trabalhou trinta anos numa churrasqueira e agora arruma carros ali perto. Dorme perto da entrada de um prédio e diz que as pessoas de lá são muito simpáticas com ele, já que o deixam estar ali, deram-lhe o colchão onde dorme e lhe vão oforecendo alguma comida. Afirma gostar de beber, mas nega ser alcoólico; já esteve no programa do Porto Feliz, mas diz que “aquilo não dá! Temos de bufar ao balão cinco vezes ao dia!”. Mas o que o Sr. J. gosta mesmo de contar são histórias do tempo que passou na tropa. Conseguimos ver no seu olhar a nostalgia e alegria que as lembranças desses tempos lhe trazem.
A próxima paragem foi no Bom Sucesso onde o JP estava a arrumar carros. Estava muito mal-humorado porque tinha sido preso naquele dia pela Polícia Municipal. Apesar dos seus pedidos para o soltarem pois já estava a ressacar, só foi solto mais tarde e estava naquele momento a arranjar os últimos trocos para ir comprar a dose. Assim, nem o café fez com que falasse um pouco connosco e depressa fomos “despachados”.
Seguimos então para a bomba de gasolina perto da Casa Agricola, já que não tínhamos encontrado o Sr. J. na Avenida da Boavista, e lá estava ele já deitado no seu saco-cama. Estava muito abatido, com o ânimo em baixo e pediu-nos desculpa porque não queria conversar. Conseguimos, pelo menos, saber que agora está sempre naquele local.
Decidimos ir ainda ao Foco para ver o M. Como já tinha recebido um saco do grupo do Fernando, não lhe deixámos um, mas oferecemos-lhe um café que ele aceitou. Aqui a visita também foi curta, pois ele estava cansado e queria ir dormir.
Assim, finalizámos mais uma ronda no Aleixo com uma oração que eu, e certamente todos nós, já consideramos essencial. É o momento da noite em que todos juntos pensamos nas pessoas com quem estivémos, nas suas realidades e no que nós gostraíamos que fossem os seus futuros. É o momento que alivia a nossa angústia e que nos inunda de esperança. É o momento em que nos sinto a todos como um só, relembrando que esta é uma tarefa que não termina ali, naquele momento.

Miriam Penha

1 comentário:

Anónimo disse...

Obrigada, Miriam, por descreveres tão bem esta minha 1ª ronda. Esta noite fez-me sentir mesmo muuuuuuuuuuuito pequenina...

Beijinhos
Joana Gomes